sexta-feira, dezembro 15, 2006

Dona Maria está cansada

Parece que chegou alguém. Vão ligar a luz de novo. Porque não me deixam aqui quieta? Eu nem consigo mandar ninguém embora. Nem consigo dizer nada. Porque minha língua tá tão pesada? Será que é a Ilza e os meninos que estão lá na sala?


“Bença, vó!”

“mmm”


Eu quase não consigo abrir os olhos, meu Deus. Porque eu não consigo responder? Termina logo com isso, meu Deus. Osso e pele. Pele quase morta, meu Deus. Será que o Raul ligou? Eu não tenho fome. Tá um cheirinho bom de café. Não quero essa papa. Me deixa aqui quieta, eu já disse. Me deixa ir embora, meu Deus.

9 comentários:

Anônimo disse...

você disse tudo,cousin. =/

Anônimo disse...

chega de sofrimento, meu Deus.

Anônimo disse...

vc expos em poucas linhas a enorme e intensa angústia que à consome..

Raquel disse...

Muito triste quando a pessoa não pode mais viver. Como eu havia te falado, o meu avô tem 97 anos, não é lúcido, mas ele é muito inteiro, até o geriatra fica encantado. Ele sempre foi meio maluco mesmo, então só aumentou a loucura, hahaha.
Mas ele anda pra cima e pra baixo, conversa, mas dorme e come muito. Tem que ver como ele é espertinho (L).

salvaterra disse...

Putz quase fiquei cego! lembrei de uns contos do gabo. posso pôr um link do teu blog lá no meu?

Anônimo disse...

Lindo !!!
Emocionante !!!
Ducaralho.

Perdida disse...

Que se faz com a vida alheia quando a vida já lhe é alheia? "Nada" é alívio, crime, resignação?

Anônimo disse...

por isso sou fã dos seus textos

Raquel disse...

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida a minha face?

Cecília Meireles